Catequese com crianças ou catequese infantil?
Vai e volta a gente escuta os catequistas dizerem: “Eu trabalho com
catequese infantil”. Todos nós que escutamos esta expressão, logo
concluímos que aquela pessoa é catequista de crianças e não de jovens ou
adultos, ou seja, que sua turma é composta de crianças na faixa etária
de mais ou menos 8 a 11 anos. Mas pensando bem, não parece estranha essa
expressão catequese infantil? Será que é
a catequese que é infantil ou o público que é infantil? Tomara que seja
o público! A catequese deve ser sempre um processo sério, maduro, que
ajude a transmitir uma experiência de fé genuína e não algo infantil ou
infantilizante.
Infelizmente, cristalizou-se entre nós uma
catequese bem infantil, no sentido negativo da expressão. Muitos
catequistas acham que, porque o destinatário do anúncio são crianças, a
fé deve ser um teologia rala e rasa, sem densidade espiritual, sem
aprofundamento bíblico. Uma espécie de papinha teológica, mais para
despertar devoções e piedades que para promover um encontro com o Deus
vivo. Então, muitos se desgastam em diminutivos como mamãe do céu, papai
do céu, Jesus nosso amiguinho. Outros se dedicam a difundir figuras que
mexem com a imaginação da criança, tais como anjos e santos da piedade
popular. E ainda tem aqueles que simplificam ou minimizam a força da
Escritura Sagrada transformando-a em histórias bem infantis,
desviando-as do sentido original do texto. Pegam os relatos bíblicos e
contam-nos como se fossem eventos acontecidos, tal qual estão escritos
ali, sem nenhuma necessidade de interpretação: uma espécie de bíblia
para crianças. É o caso do relato da criação, da queda, de Abrão e sua
gente, de Sansão e Dalila, de José do Egito. Tudo bem que as crianças
entrem em contato também com o Antigo Testamento. É muito bom que seja
assim, mas não basta transformar esses relatos em histórias infantis.
Eles precisam ser interpretados teologicamente, pois o autor sagrado
quando os redigiu não escrevia uma história real, mas uma catequese ou
teologia que pudesse ajudar sua gente a crescer na fé.
O perigo
que corremos com esse tipo de catequese é de infantilizar a fé. Porque
lidamos com crianças não quer dizer que devemos testemunhar uma fé
infantil, sem sólidos fundamentos, nem que devemos proporcionar uma
experiência de fé ingênua e tola que não se sustente ao longo da vida.
Uma catequese assim não prepara um seguidor de Jesus, um discípulo; ela
forma o ateu de amanhã. Quando vier a primeira tempestade da vida,
aquele católico – agora jovem ou adulto – vai ver sua fé ir embora na
enxurrada dos destroços de sua vida. Quando aparecerem os primeiros
questionamentos científicos, sua fé vai desmoronar como um castelo de
areia. Quando as primeiras e sérias decisões precisarem ser tomadas, ele
verá que seus princípios religiosos são frágeis e não lhe dão segurança
para seguir seu caminho. Ele se sentirá traído e enganado, e não
apoiado e sustentado pela fé.
Ora, o que a catequese pretende:
ensinar umas historinhas da carochinha ou formar o cristão de amanhã? O
que nós queremos: envernizar a vida das crianças com devoções populares
baseadas em anjos da guarda ou ajudá-las a construir uma espiritualidade
sólida e forte? Será que, quando essa criança crescer, a oração do anjo
da guarda será suficiente para aliviar sua dor na hora da crise? Será
que mandar um beijo para a mamãe do céu será o bastante para afagar seu
espírito abatido na hora do sofrimento? Parece que não! A fé infantil e
infantilizante que temos dado às nossas crianças sucumbe no primeiro
vendaval de emoções da adolescência, ela tem se desfeito mesmo antes do
ataque da racionalidade que vem por ocasião da juventude. Tanto é que
normalmente essas crianças nem têm chegado à crisma (por volta dos 15
anos); despedem-se da Igreja na primeira e última comunhão.
Pensando nisso, entendemos que é preciso desde cedo dar às crianças uma
experiência de fé confiável, na dose da criança é claro, mas uma
experiência de fé autêntica e forte que a acompanhe pela vida e com ela
amadureça cada dia. Então, em vez de ensinar orações devocionais,
devemos ensinar de fato a rezar, a entrar em comunhão com Deus. Em vez
de transformar Jesus em um amiguinho, melhor proporcionar uma
experiência de seguimento de Jesus de Nazaré. Em vez de minimizar a dor
do Calvário, melhor refletir sobre as maldades humanas. Em vez de
transformar Deus em um papai do céu, que vive brincando com anjos na
eternidade, melhor mostrar que ele é o pai de Jesus Cristo e nosso pai.
Certamente que não vamos transformar Deus em um juiz implacável que fica
anotando pecados lá no céu, com o intuito de vingá-los na hora do
juízo. Mas daí a descaracterizar Deus, transformando-o no “amigo lá de
cima”, num velhinho tipo papai noel ou numa energia cósmica, já parece
demais. Em vez de ensinar que o Espírito Santo é uma pomba, parece mais
inteligente mostrar que ele é Deus conosco. E assim vai. A catequese
para crianças não pode e não deve ser uma catequese infantil, mas
adulta, madura, como deve ser toda expressão de fé. Amenizar os
mistérios da fé ou colocar tudo no diminutivo não resolve o problema
catequético. Só nos cria mais um problema com consequências funestas
para o futuro.
Solange Maria do Carmo
Nenhum comentário:
Postar um comentário